Impressão 3D e Propriedade Intelectual

Olá pessoal!

Sou advogada atuante em Propriedade Intelectual e Direito Digital. Atualmente estou fazendo mestrado no tema “os impactos da impressão 3D na propriedade intelectual”, com o foco de encontrar maneiras que essa tecnologia seja recepcionada sem passar pelas penúrias que a tecnologia p2p encontrou na década passada - e ainda tem encontrado - em face das grandes indústrias de entretenimento.

Sei que nos EUA esse é um assunto em voga, devido ao fato de que várias empresas detentoras de direitos intelectuais já estarem enviando pedidos de retirada de designs disponibilizados online que infrinjam algum direito autoral, marca, desenho industrial ou patente.

Sendo assim, gostaria de saber se alguém dessa comunidade tem notícias de casos que envolvam propriedade intelectual e impressão 3D aqui no Brasil. E aproveito para deixar um pedido de que, caso saibam de algo, por favor me enviem um email sobre ou falem por aqui mesmo (bruna@direitotech.com).

Ainda, acho que seria legal abrir nesse fórum um espaço para que essa discussão possa ser desenvolvida, devido ao fato de que dependendo dos entendimentos que os tribunais proporcionarem às decisões que envolvam PI e 3D, o futuro dessa tecnologia e suas possibilidades de desenvolvimento possam se encontrar ameaçadas.

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Podemos começar pelo título que deixa espaço para uma interpretação dúbia e deveras tendenciosa do assunto, leva a pensar que a tecnologia em si é o fator primordial a impactar, de forma negativa (no sentido de causar prejuízo a) a PI. A impressão 3D em si é uma tecnologia e, fundamentalmente, é neutra, quem impacta uma PI é o uso que se faz de alguma técnica ou tecnologia, afinal, você pode usar uma faca para cortar alimentos, assim como pode usá-la para esfaquear um desafeto.

Acho que são duas coisas totalmente diferentes e essa afirmação tenta entrelaçar duas coisas pelo ponto de vista da lesão à PI, fato este que não é o objetivo principal de nenhuma destas tecnologias, mas que obviamente podem ser utilizadas para tal, assim como praticamente qualquer coisa, em termos, pode ser usada de forma maliciosa. Neste aspecto, o P2P sofre desde que foi criado até hoje e não apenas na década passada, aliás as ações mais duras contra sistemas baseados em P2P foram tomadas nos últimos anos e não a mais de 10 anos atrás.

P2P é um protocolo para troca de dados, que, como sabemos, pode e é utilizado para trocar informação protegida por leis de direitos autorais, mas este é um problema que advém do uso que se faz da mesma, muitos usuários e empresas utilizam este protocolo para diminuir cargas em hosts ou disponibilizar informação livre, tendo em vista que a banda consumida é suportada pelos próprios usuários, que atuam como servidores temporários, daí o nome do protocolo, por exemplo, a Blizzard, desenvolvedora do jogo World of Warcraft, utiliza P2P para distribuir as atualizações de suas PI’s, assim como várias empresas que fazem distribuições de Linux utilizam P2P para diminuir a carga em seus servidores.

A impressão 3D, por outro lado, cria e/ou replica objetos físicos e não exatamente informação, neste aspecto, o seu uso talvez seja menos nociva à PI que um software que permite distribuir.toda a informação fruto de anos de trabalho de uma empresa.

Sempre que um grupo empresarial se vê de alguma forma ameaçado por alguma coisa, ele reage, afinal, estamos num mundo capitalista, no entanto, a história demonstra que as empresas que não se adequam às novidades, acabam por ficarem para trás e perecem, como é o caso de estúdios e gravadoras que não conseguiram acompanhar a digitalização e distribuição de música, no entanto, nesse sentido a legislação estadunidense tem um avanço significativo que é o Fair use [em inglês].

Não tenho casos, acho que no Brasil, apesar dos preços estarem baixando bastante, o acesso e adoção da impressão 3D ainda é limitado, mas deve crescer nos próximos anos, mas. mudando de assunto, num fórum aberto, nunca se deixa e-mail para tratar privativamente sobre alguma coisa, sendo que o conhecimento é de interesse de todos.

Desculpe discordar, sei que posso até estar sendo chato, mas não… Todo fórum tem uma temática, um assunto específico do qual trata e este trata especificamente do movimento Maker, eletrônica, programação, FVM, Fabricação Digital e relacionados. Acho que se deseja discutir jurisprudência, decisões, peças processuais, você deve procurar um fórum cuja temática seja jurídica, ou talvez, não tenha entendido a sua colocação, mas pense bem… entre os vários assuntos no fórum: “Eletrônica”, “Arduino”, “Fabricação Digital” estará lá um “Doutrina Jurídica”…Qual destes assuntos é desconexo? Talvez possa se tratar sobre isso em “Fabricação Digital”, mas acho que é um assunto de pouco interesse para a maioria dos usuários deste fórum.

Aqui foi muito dramático… :smile: Depois que a patente sobre o Fused Deposition Modeling (FDM) expirou e o desenho da RepRap foi aberto ao público, simplesmente não tem mais volta, a Internet não esquece! Me parece que este ano vai expirar (ou já expirou, não sei) a patente sobre a Selective Laser Sintering (SLS) e quem sabe, teremos no futuro próximo, impressoras 3D a laser bem mais baratas (hoje elas custam por volta de $200k). Vê como não é bem o intuito tecnológico impactar PI… As patentes expiraram para que nós tivéssemos acesso às impressoras 3D baseadas em FDM.

Oi @sksdutra! Nessa postagem eu não procurei me aprofundar no tema, até porque é algo que ainda está sendo explorado e as implicações não são integralmente conhecidas. Intentei abrir o espaço para a discussão, a qual você tão bem iniciou, e aproveitei para solicitar casos que tenham ocorrido no Brasil, envolvendo PI e 3D. Entendo como uma frase assim pode ser entendida de maneira genérica, mas com certeza posso me explicar melhor.

De maneira alguma o título é tendencioso ou afirma que a tecnologia leva “culpa” por qualquer coisa. De fato, se essa preocupação existe é porque na última decada os sistemas judiciários mundiais tem interpretado que são as tecnologias disruptivas as culpadas pelo infringimento de direitos estabelecidos, de maneira diversa aos julgados de décadas atrás. Ora, em 1984, a Suprema Corte dos Estados Unidos julgou o caso Universal versus Sony. O Estúdio Universal acusava a Sony de oferecer ao público uma tecnologia que infringia diretamente o seu Copyright: o VHS. Felizmente, a Corte decidiu que a tecnologia do VHS por si só não era responsável pela violação autoral. O mesmo ocorreu com os julgados que permitiram que a fotografia, rádio, tv a cabo e até mesmo Hollywood se desenvolvesse. Ou seja, novas tecnologias bateram de frente com leis descabidas para as suas aplicações e o judiciário posicionou-se de maneira sábia o bastante, não cerceando o desenvolvimento de uma tecnologia pelo fato de esta romper com interesses de detentores de direitos intelectuais.

Em uma obra extremamente famosa que deve conhecer (“Cultura Livre”) de Lawrence Lessig, fica explicado de forma brilhante como a Corte não tem tomado essas decisões que delinearam o nosso passado no que se diz da tecnologia p2p. Lessig elenca inúmeras razões e, uma delas, é o forte lobby econômico que as indústrias de entretenimento exercem, ameaçando o p2p por enxergar nesta tecnologia uma forma de diminuição de lucros de seu modelo de negócios convencional. Com certeza esse é um assunto o qual você possui conhecimento.

Parece-me que o equívoco em sua fala perpassa no fato de encontrar qualquer tendência no meu discurso breve. Deixo bem claro que sou a favor do desenvolvimento tecnológico e o meu interesse em estudar PI é justamente esse: favorecer tecnologias capazes de exercer sua função econônima e social. Essa é, pois, a intenção na qual a PI foi concebida. O que ocorre é que por interesses individualistas, enxergou-se na ferramenta de proteção ao desenvolvimento - a PI - uma forma de defender o lucro de empresas convencionais. Ou seja, a defesa da ferramenta tornou-se mais forte e maior do que os valores da defesa em si.

É nisso que reside a intenção da minha pesquisa.

Infelizmente essa informação não é precisa. É necessário observar que enquanto a tecnologia p2p afeta apenas o “mundo dos bits”, a impressão 3D é capaz de afetar o “mundo dos átomos”. Vejamos assim: dentro de propriedade intelectual existem dois ramos - direitos autorais e propriedade industrial. Os direitos autorais foram aqueles “infringidos” pela tecnologia p2p. São esses os direitos que as empresas de entretenimento querem tanto proteger. Por outro lado, quando se fala em propriedade industrial, tem-se: patente, marca, desenho industrial, entre outros. Esses são bens intelectuais tutelados pelas maiores empresas do mundo. Ora, por mais que os meios digitais sejam protagonistas em nossas vidas, é um fato que a economia digital representa apenas 14% da economia global (http://www.citibank.com/transactionservices/home/docs/the_new_digital_economy.pdf). Ou seja, boa parte do resto é representado por bens físicos, e pela primeira vez na história, esses bens físicos podem ser digitalizados e impressos, sendo eles protegidos ou não por direitos condedidos na propriedade industrial!

Se as empresas que sentiram ter seus direitos autorais violados pelo compartilhamento na rede tomaram medidas judiciais milionárias, imagine só o que empresas que tem sua propriedade industrial - a maioria das grandes empresas atuais possuem isso como algo extremamente valioso - violada com o auxílio da impressão 3D não farão? A última década traz indicativos dessa ação e nos EUA, Inglaterra, Austrália e Canadá já é possível observar como as empresas tem caminhado para isso com uma porção de pedidos de notice and takedown para sites que apenas reunem em um só lugar catálogos de designs tridimensionais que infringem alguma PI.

O episódio do p2p nos mostraram algumas coisas, especialmente no que se diz da reação das empresas em face de tecnologias que abalam seus modelos de negócio. Primeiro as empresas tentam, com processos milionários, cercear o desenvolvimento da tecnologia; em segundo, tentam desenvolver tecnologias que impeçam que a tecnologia se desenvolva de maneira integral (v.g. DRM); terceiro, as empresas tentam se adaptar às novas possibilidades trazidas.

Espero que em face da impressão 3d, as empresas pulem o primeiro e segundo passo, indo direto para o terceiro. Como sabemos, o 1 e 2 trouxeram - e tem trazido - prejuízos para a tecnologia p2p e para aqueles acusados de usá-la para infringir PI (entendimento jurisprudencial). Infelizmente o fair use - inexistente no direito brasileiro - em pouco ajudou nesse cenári. Felizmente, surgiram iniciativas interessantes como o Creative Commons.

Apenas deixei a opção livre. Pode ser que a pessoa seja uma das agentes da ação judicial e não tenha intenção de se expor. Espero que possa e seja público, acho que uma análise coletiva contribuiria imensamente para o meu desenvolvimento de raciocínio.

Talvez seja um assunto de pouco interesse, talvez não. Mas com certeza o nome não seria “Doutrina Jurídica”, e sim 3D e PI, haja vista ser esse um assunto que influirá diretamente na profissão do designer tridimensional, na demanda por materiais impressos e no desenvolvimento da tecnologia em si.

Quem dera ser dramático :confused: acho que você fez uma pequena confusão aqui. De fato quando se fala em impressão 3D e PI, pode-se falar também a respeito da expiração das patentes da tecnologia em si. Porém, minha preocupação recai nos EFEITOS da impressão 3D para a PI. Por exemplo: como poderá alguém disponibilizar online um design que infringe direito autoral, marca ou patente sem correr o risco de receber um pedido de retirada do conteúdo ou receber um processo judicial; se as pessoas poderiam imprimir peças de reposição em casa com suas impressoras sem temerem estarem infringindo alguma patente (pela lei de prorpriedade industrial atual, quem faz isso está sim infringindo a lei); entre várias outras questões.

Cito novamente que essa não é uma questão especulativa ou “dramática”. Desdobramentos já vem ocorrendo e é a minha melhor intenção pesquisá-las desde já, de maneira que o judiciário não seja pego de surpresa por querelas vindouras dentro desse cenário. Ainda mais porque a impressão 3D traz consigo incógnitas técnicas e conceituais que ainda não foram devidamente contempladas por nossos pensadores.

Talvez não seja esse um assunto que chame tanta atenção por aqui. Eu realmente espero que seja.

Agradeço as suas reflexões e indagações e espero por mais!

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Bom, vejo que de fato, muitas das minha reflexões recaíram sobre uma interpretação errônea(ou pelo menos parcialmente errônea) das intenções apresentadas, no entanto, mantenho a maioria, mas evitarei divagar por mais tempo, caso contrário o tópico se tornará deveras extenso e tedioso, acabando por não atrair a atenção de mais ninguém além de nós dois.

Deixando as críticas de lado, mesmo até porque você já deve tê-las por demais do seu orientador, uma pessoa certamente mais qualificada que a maioria de nós para fazê-las, me apegarei à parte mais prática do questionamento…

Um objeto, para ser confeccionado, ele precisa ser modelado, então, alguém deve ter produzido o desenho, que obviamente será utilizado para produzir o objeto. O problema é que, se alguém disponibiliza esse objeto publicamente, muitas pessoas o pegam, reproduzem em suas impressoras 3D e, teoricamente, se esse desenho é protegido, causará danos financeiros à detentora da patente.

Meu questionamento sobre isso seria o seguinte: Se a pessoa conseguiu replicar um desenho que existe no mercado e é protegido, deve se apurar se isso foi intencional ou não (algo que deve ser bem difícil de definir juridicamente), e mesmo que tenha sido intencional, tendo essa pessoa criado aquele modelo, ela não teria a propriedade intelectual (mesmo que não formalizada) daquele projeto?

Também, com o intuito de agregar ao seu trabalho, encontrei um caso no Brasil que não é exatamente sobre impressão 3D, ela está envolvida, pois muitos protótipos foram feitos com impressoras 3D por designers contratados, mas não é o centro: Super Cooler vs. Spin Chill, que começou como uma disputa pela idéia e hoje é uma peleja por causa, justamente, do desenho do produto, talvez seja um caso interessante para você.

Acho que um vídeo interessante seria o do @patola e creio que ele certamente tem umas boas opiniões sobre essa sua indagação para compartilhar:

  • Nota: Acho que o tópico deve ser categorizado como “Fabricação Digital”.

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Mais uma vez, obrigada pelas reflexões @sksdutra! Não encontro muitas pessoas, especialmente na área jurídica, para conversar sobre os pormenores desse assunto. Por isso achei que seria uma boa ideia tentar abordar isso em uma comunidade como essa :smile:

Quando se fala em patente, a lei diz que aquele que tem a proteção da patente possui o “direito de exclusiva”, ou seja, só ele pode usar aquela invenção. Sendo assim, caso alguém faça uma invenção sabendo que esta já existe, essa pessoa está agindo de má-fé, pois aquele que patenteou a invenção tem o direito de exclusiva pelo prazo de 20 anos. Ainda, caso a pessoa tenha feito uma invenção sem saber que essa já existe, mesmo assim, é reservado ao titular da patente o direito de solicitar que a pessoa deixe de fazer uso de sua invenção protegida. Ainda, dentro das patentes, a proteção só é concedida caso o pedido de concessão seja feito perante o INPI, que irá fazer um exame muito específico para saber se aquele tipo de invenção já não está protegido no mercado. Se já estiver, mesmo a pessoa tendo inventado sem saber que já existe, o INPI não irá conceder a proteção. Então, o que me preocupa nessa questão seriam aquelas pessoas que reproduzem em casa produtos patenteados e não dão uso comercial a ela. Na lei, o detentor do direito intelectual poderia exigir que a pessoa cesse esse uso, infelizmente. Caso essa atitude ganhe proporções aqui no Brasil - como tem ganhado nos EUA - o ecossistema de “Consertador” estimulado pela impressão 3D pode se encontrar ameaçado.

Ok, eu não conhecia esse caso! Vou ver melhor do que se trata e volto aqui para escrever minhas conclusões, obrigada!!

@patola, se tiver maiores opiniões sobre o assunto, ficaria muito feliz que participasse da conversa! :smiley:

Ok!

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Outra coisa que esqueci de mencionar seria a questão do Scanner 3D, senti falta da abordagem dessa tecnologia, tendo em vista que eles são usados justamente para copiar o design para, em conjunto com impressoras 3D, replicá-lo. Tem algum material no próprio Fazedores.

Ah sim, em um artigo recente que escrevi sobre o tema eu abordo a questão do scanner 3D, mas quando explico sobre as formas de conceber um design: manualmente (a pessoa elabora na plataforma CAD o design do zero) ou automaticamente (com o scanner 3D).

Muito legal este thread!
@bru_castanheira veja se dá um palpite nesta pergunta aqui: Advogados Fazedores / Hardware Livre e Creative Commons