Impressão 3D e Propriedade Intelectual

Oi @sksdutra! Nessa postagem eu não procurei me aprofundar no tema, até porque é algo que ainda está sendo explorado e as implicações não são integralmente conhecidas. Intentei abrir o espaço para a discussão, a qual você tão bem iniciou, e aproveitei para solicitar casos que tenham ocorrido no Brasil, envolvendo PI e 3D. Entendo como uma frase assim pode ser entendida de maneira genérica, mas com certeza posso me explicar melhor.

De maneira alguma o título é tendencioso ou afirma que a tecnologia leva “culpa” por qualquer coisa. De fato, se essa preocupação existe é porque na última decada os sistemas judiciários mundiais tem interpretado que são as tecnologias disruptivas as culpadas pelo infringimento de direitos estabelecidos, de maneira diversa aos julgados de décadas atrás. Ora, em 1984, a Suprema Corte dos Estados Unidos julgou o caso Universal versus Sony. O Estúdio Universal acusava a Sony de oferecer ao público uma tecnologia que infringia diretamente o seu Copyright: o VHS. Felizmente, a Corte decidiu que a tecnologia do VHS por si só não era responsável pela violação autoral. O mesmo ocorreu com os julgados que permitiram que a fotografia, rádio, tv a cabo e até mesmo Hollywood se desenvolvesse. Ou seja, novas tecnologias bateram de frente com leis descabidas para as suas aplicações e o judiciário posicionou-se de maneira sábia o bastante, não cerceando o desenvolvimento de uma tecnologia pelo fato de esta romper com interesses de detentores de direitos intelectuais.

Em uma obra extremamente famosa que deve conhecer (“Cultura Livre”) de Lawrence Lessig, fica explicado de forma brilhante como a Corte não tem tomado essas decisões que delinearam o nosso passado no que se diz da tecnologia p2p. Lessig elenca inúmeras razões e, uma delas, é o forte lobby econômico que as indústrias de entretenimento exercem, ameaçando o p2p por enxergar nesta tecnologia uma forma de diminuição de lucros de seu modelo de negócios convencional. Com certeza esse é um assunto o qual você possui conhecimento.

Parece-me que o equívoco em sua fala perpassa no fato de encontrar qualquer tendência no meu discurso breve. Deixo bem claro que sou a favor do desenvolvimento tecnológico e o meu interesse em estudar PI é justamente esse: favorecer tecnologias capazes de exercer sua função econônima e social. Essa é, pois, a intenção na qual a PI foi concebida. O que ocorre é que por interesses individualistas, enxergou-se na ferramenta de proteção ao desenvolvimento - a PI - uma forma de defender o lucro de empresas convencionais. Ou seja, a defesa da ferramenta tornou-se mais forte e maior do que os valores da defesa em si.

É nisso que reside a intenção da minha pesquisa.

Infelizmente essa informação não é precisa. É necessário observar que enquanto a tecnologia p2p afeta apenas o “mundo dos bits”, a impressão 3D é capaz de afetar o “mundo dos átomos”. Vejamos assim: dentro de propriedade intelectual existem dois ramos - direitos autorais e propriedade industrial. Os direitos autorais foram aqueles “infringidos” pela tecnologia p2p. São esses os direitos que as empresas de entretenimento querem tanto proteger. Por outro lado, quando se fala em propriedade industrial, tem-se: patente, marca, desenho industrial, entre outros. Esses são bens intelectuais tutelados pelas maiores empresas do mundo. Ora, por mais que os meios digitais sejam protagonistas em nossas vidas, é um fato que a economia digital representa apenas 14% da economia global (http://www.citibank.com/transactionservices/home/docs/the_new_digital_economy.pdf). Ou seja, boa parte do resto é representado por bens físicos, e pela primeira vez na história, esses bens físicos podem ser digitalizados e impressos, sendo eles protegidos ou não por direitos condedidos na propriedade industrial!

Se as empresas que sentiram ter seus direitos autorais violados pelo compartilhamento na rede tomaram medidas judiciais milionárias, imagine só o que empresas que tem sua propriedade industrial - a maioria das grandes empresas atuais possuem isso como algo extremamente valioso - violada com o auxílio da impressão 3D não farão? A última década traz indicativos dessa ação e nos EUA, Inglaterra, Austrália e Canadá já é possível observar como as empresas tem caminhado para isso com uma porção de pedidos de notice and takedown para sites que apenas reunem em um só lugar catálogos de designs tridimensionais que infringem alguma PI.

O episódio do p2p nos mostraram algumas coisas, especialmente no que se diz da reação das empresas em face de tecnologias que abalam seus modelos de negócio. Primeiro as empresas tentam, com processos milionários, cercear o desenvolvimento da tecnologia; em segundo, tentam desenvolver tecnologias que impeçam que a tecnologia se desenvolva de maneira integral (v.g. DRM); terceiro, as empresas tentam se adaptar às novas possibilidades trazidas.

Espero que em face da impressão 3d, as empresas pulem o primeiro e segundo passo, indo direto para o terceiro. Como sabemos, o 1 e 2 trouxeram - e tem trazido - prejuízos para a tecnologia p2p e para aqueles acusados de usá-la para infringir PI (entendimento jurisprudencial). Infelizmente o fair use - inexistente no direito brasileiro - em pouco ajudou nesse cenári. Felizmente, surgiram iniciativas interessantes como o Creative Commons.

Apenas deixei a opção livre. Pode ser que a pessoa seja uma das agentes da ação judicial e não tenha intenção de se expor. Espero que possa e seja público, acho que uma análise coletiva contribuiria imensamente para o meu desenvolvimento de raciocínio.

Talvez seja um assunto de pouco interesse, talvez não. Mas com certeza o nome não seria “Doutrina Jurídica”, e sim 3D e PI, haja vista ser esse um assunto que influirá diretamente na profissão do designer tridimensional, na demanda por materiais impressos e no desenvolvimento da tecnologia em si.

Quem dera ser dramático :confused: acho que você fez uma pequena confusão aqui. De fato quando se fala em impressão 3D e PI, pode-se falar também a respeito da expiração das patentes da tecnologia em si. Porém, minha preocupação recai nos EFEITOS da impressão 3D para a PI. Por exemplo: como poderá alguém disponibilizar online um design que infringe direito autoral, marca ou patente sem correr o risco de receber um pedido de retirada do conteúdo ou receber um processo judicial; se as pessoas poderiam imprimir peças de reposição em casa com suas impressoras sem temerem estarem infringindo alguma patente (pela lei de prorpriedade industrial atual, quem faz isso está sim infringindo a lei); entre várias outras questões.

Cito novamente que essa não é uma questão especulativa ou “dramática”. Desdobramentos já vem ocorrendo e é a minha melhor intenção pesquisá-las desde já, de maneira que o judiciário não seja pego de surpresa por querelas vindouras dentro desse cenário. Ainda mais porque a impressão 3D traz consigo incógnitas técnicas e conceituais que ainda não foram devidamente contempladas por nossos pensadores.

Talvez não seja esse um assunto que chame tanta atenção por aqui. Eu realmente espero que seja.

Agradeço as suas reflexões e indagações e espero por mais!

xx

1 curtida